Por Fernanda Cursino
Depois da cassação do Deputado Estadual Arthur do Val (Mamãe Falei), por quebra de decoro parlamentar por consequência de falas misóginas em relação às mulheres ucranianas, agora foi a vez do vereador da cidade do Rio de Janeiro Gabriel Monteiro, que também foi cassado por quebra de decoro em decorrência das acusações de estupro de menor, de assédio sexual e de forjar vídeos para a internet.
É importante entender o motivo da cassação de ambos que, infelizmente, não têm nada a ver com uma sociedade que está finalmente se desconstruindo de uma estrutura machista, misógina e sexista. Ao contrário, se deu por pressão popular e pelo movimento feminista. Essa pressão alcançou as mídias populares e não é interessante para a extrema direita que exalta a moral, a família e os bons costumes, ter escândalos vindos à baila como os que vieram à tona do Mamãe Falei e do Gabriel Monteiro que integram esse grupo.
Há quem diga que as cassações são diferentes, porque um só verbalizou e o outro cometeu. É importante analisarmos que, à medida que se verbaliza, é porque já existe uma pré-disposição para consumar o ato, e isso não diminui a gravidade de ambos e, infelizmente, esse comportamento não é isolado, só que nesse caso, se tornaram públicos.
Isso nos leva a um diagnóstico triste de como somos ainda uma sociedade doente, calcada em estruturas opressivas e extremamente violentas.
Nascer mulher, negra, periférica ou ser trans nessa sociedade nos tornam alvo de todos os tipos de violência. É conviver com essa violência diuturnamente. Não estamos seguras nem em casa, nem no trabalho, nem na rua, nem no transporte coletivo, nem na internet, nem no hospital e nem no ventre.
Violentam os nossos corpos, as nossas mentes, a nossa moral, a nossa existência.
Mesmo que as cassações do deputado e do vereador estuprador seja um passo a ser comemorado, ainda estamos muito distantes de uma sociedade segura para os corpos femininos. É cansativo, pesado e frustrante saber que isso é só a ponta de um Iceberg. A pior violência é aquela silenciosa, sutil, velada, e a mais difícil de combater. É a que fomenta todas as outras violências e está muito mais ativa e dilaceradora, pois está presente nos relacionamentos passionais, amistosos, profissionais e até nos políticos e partidários. E isso é o mais cruel porque é nessas relações que somos tratadas como loucas, histéricas, perturbadas, agressivas, raivosas e por aí vai…
A sociedade não se dá conta do quanto essas violências ferem, e isso é tratado como algo rotineiro, normal, e não é incomum ouvirmos coisas como: “As coisas são assim mesmo”, “Foi só uma brincadeira”, “Você é que entendeu errado”, “Você está exagerando”, “Você que é difícil”, “Você que é agressiva”, “Homem é assim mesmo”, “ As mulheres é que são sentimentais” e todas as outras inúmeras frases que escutamos rotineiramente.
E assim é a nossa sociedade: os homens, brancos, ricos, héteros ejaculam todo tipo de violência sobre a nossa existência e ainda esperam que sejamos pedagógicas e pacientes.
Nem todo homem, mas sempre um homem.
É preciso entender que a misoginia e o sexismo por si só já é uma violência, e que o machismo oprime, fere, estupra e mata.